O Senado Federal aprovou nesta terça-feira (10) o projeto de lei que regula a inteligência artificial (IA) no Brasil. O texto, considerado um marco regulatório para o setor, segue agora para a Câmara dos Deputados. O objetivo é estabelecer regras para o desenvolvimento e o uso de sistemas de IA, com ênfase na proteção dos direitos autorais e na definição de responsabilidades sobre o uso da tecnologia.
Principais pontos do projeto
A proposta aprovada é um substitutivo do senador Eduardo Gomes (PL-TO), que se baseia no Projeto de Lei 2.338/2023, de autoria do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. O texto incorporou contribuições de outras sete propostas legislativas e dezenas de emendas apresentadas por senadores.
O texto exclui os algoritmos de redes sociais da lista de sistemas considerados de alto risco, uma decisão que provocou divergências entre governistas e oposicionistas. No entanto, manteve-se a previsão de proteção dos direitos dos criadores de conteúdo e obras artísticas, o que foi celebrado por artistas e profissionais liberais que acompanharam a votação no Plenário.
Sistemas de alto risco
A legislação divide os sistemas de IA em níveis de risco e estabelece regras específicas para os considerados de “alto risco”. Entre eles, destacam-se:
- Veículos autônomos;
- Controle de trânsito e gestão de água e eletricidade, quando houver risco à integridade física das pessoas;
- Seleção de estudantes para o acesso à educação;
- Tomada de decisões em recrutamento, promoção e demissão de trabalhadores;
- Diagnósticos médicos e controle de fronteiras;
- Reconhecimento de emoções por identificação biométrica.
O uso de câmeras para reconhecimento facial em espaços públicos será permitido apenas para a localização de pessoas desaparecidas, recaptura de fugitivos e investigação de crimes de maior gravidade.
Direitos Autorais e Proteção de Conteúdo
O texto também protege os direitos de criadores de conteúdo e artistas, prevendo que obras protegidas por direitos autorais possam ser usadas em “mineração de textos” para o desenvolvimento de sistemas de IA. Contudo, a utilização deve ocorrer de forma lícita e sem fins comerciais, sendo vedada a reprodução ou disseminação de tais obras.
Outra novidade é a obrigação de remuneração aos detentores de direitos autorais pelo uso de suas obras em processos de mineração, treinamento e desenvolvimento de sistemas de IA que sejam comercializados.
Criação de órgãos reguladores
O texto prevê a criação do Sistema Nacional de Regulação e Governança de Inteligência Artificial (SIA), que será coordenado pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). O SIA contará com a participação de órgãos de autorregulação e certificação, além de conselhos consultivos formados por especialistas e cientistas do setor.
A ANPD terá competência normativa, regulatória e sancionadora para supervisionar a aplicação das normas e impor sanções administrativas. Essas penalidades podem incluir multas de até R$ 50 milhões ou 2% do faturamento bruto do grupo econômico.
Regras para IA Generativa e Propósito Geral
Os sistemas de inteligência artificial generativos e de propósito geral, que produzem conteúdos sintéticos como textos, imagens e vídeos, também terão regras específicas. Esses sistemas deverão conter metadados que identifiquem sua origem e verificar sua autenticidade.
Impacto para o poder público e a sociedade
No setor público, o uso de IA será regulamentado para garantir a rastreabilidade das decisões automatizadas. O texto exige que os sistemas de IA utilizados por órgãos públicos registrem quem os utilizou, com qual finalidade e em que contexto.
Os cidadãos também terão direitos assegurados, como o acesso à explicação e à revisão de decisões automatizadas que tenham impacto jurídico relevante. Ademais, sistemas de reconhecimento biométrico deverão respeitar o direito à não discriminação.
Próximos passos
Com a aprovação no Senado, o projeto de lei será enviado à Câmara dos Deputados, onde poderá ser alterado antes de voltar ao Senado para uma análise final. A expectativa é que a discussão continue intensa, sobretudo em relação à classificação dos sistemas de alto risco e à proteção dos direitos autorais.
Ao comentar o texto, o relator Eduardo Gomes classificou a proposta como “o texto possível” e destacou a necessidade de atualização constante das regras devido à velocidade das inovações tecnológicas. Ele também afirmou que a proposta preserva a liberdade de expressão e o acesso à informação.
A proposta tem vigência prevista para 730 dias após sua publicação, mas algumas regras, como as relativas a direitos autorais, entrarão em vigor em 180 dias. Os próximos passos do projeto serão acompanhados de perto pela sociedade civil, por setores da economia digital e por artistas preocupados com a exploração de suas obras por sistemas de inteligência artificial.
Fonte: Agência Senado