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É proibido fumar, por Eudes Quintino

*Eudes Quintino de Oliveira Júnior, promotor de justiça aposentado, mestre em direito público, pós-doutorado em ciências da saúde, advogado, sócio fundador do escritório Eudes Quintino Sociedade de Advogados

As gerações de 50, 60 e 70 foram incentivadas pela indústria do tabagismo a fazer uso do cigarro como se fosse um acólito necessário e de fundamental importância na vida social. Tanto é que a indústria cinematográfica e as propagandas das grandes marcas passaram a divulgar imagens de homens e mulheres fumando em poses clássicas de apelo ao produto.

O movimento antitabagismo, em contrapartida, ganhou corpo e passou a frequentar espaços nos meios de comunicação com a intenção de demonstrar que o fumo é prejudicial à saúde, não só para quem dele faz uso, como, também, o mal se estende aos não fumantes, que ficam expostos às indesejadas baforadas.

Na Europa, Portugal, há poucos dias, tomou nova iniciativa e prepara outra investida com um pacote de medidas tendo como objetivo não só restringir a venda de cigarros, como também a proibição de fazer uso dele em ambientes públicos e os fumódromos existentes até então permitidos, deixarão de existir.[1]

Canadá, país que experimenta a morte de 48 mil cidadãos por ano, com a intenção de proteger crianças e jovens, vai endurecer sua legislação contra o tabagismo, inclusive com a inserção de mensagens nas embalagens desestimulando o uso de cigarros.[2]

O Brasil ganha local de destaque no cenário mundial com relação à lei antifumo. A Lei 12.546/2011, que deu nova redação aos artigos 2º e 3º da Lei 9.254/96, regulamentada pelo Decreto 8.262/2014, estabelece: É proibido o uso de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou qualquer outro produto fumígeno, derivado ou não do tabaco, em recinto coletivo fechado, privado ou público.

Deve-se buscar no nascedouro a motivação da lei antifumo. A principal nocividade do tabaco reside em conter monóxido de carbono e viciar paulatinamente, sem dose letal como outras drogas, mas que provoca dependência e a ocorrência de doenças respiratórias, cardíacas, além de abrir espaço para a ansiedade e depressão e outras doenças. O interesse que determinou a mens legis foi o de proteger a saúde não só do fumante, como também do tabagista passivo, que vem a ser aquele que inala fumaça dos derivados de tabaco, em ambientes fechados. É a chamada Poluição Tabagística Ambiental, assim denominada pela Organização Mundial da Saúde.

Ora, a ratio legis é a de cuidar da saúde dos fumantes e não fumantes em locais fechados, independentemente ou não de qualquer solicitação. A Lei Maior determina, de forma taxativa, que a saúde é direito de todos e obrigação do Estado, que adotará as políticas de atuação, compreendendo aqui as preventivas, visando reduzir o risco de doenças e de outros agravos.[3] A lei proibitiva do fumo, agora de alcance nacional em razão da Lei nº 12.546/2011, repete em seu art. 2º o preceito impeditivo da Lei Paulista nº 13.541/2009, que proíbe “o uso de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou qualquer outro produto fumígeno, derivado ou não do tabaco, em recinto coletivo fechado, privado ou público“.

Quando o legislador faz uso da conjunção alternativa “ou” e a ela soma o pronome indefinido “qualquer”, pretende, de forma inequívoca, alcançar todas as situações que carregam semelhança com aquela lançada como regra. É uma perfeita adequação de compatibilidade, sem fugir do escopo principal da lei. Ou, como o sempre arguto Maximiliano observou, a norma enfeixa um conjunto de providências, protetoras, julgadas necessárias para satisfazer a certas exigências econômicas e sociais; será interpretada de modo que melhor corresponda àquela finalidade e assegure plenamente a tutela de interesse para a qual foi regida.[4]

Ora, é de consenso popular que a lei antifumo “pegou” e não encontra qualquer condicionante entre os cidadãos, que espontaneamente exercem a sua fiscalização e execução.  Caiu na graça popular e transita sem qualquer restrição, com o rótulo de lei preferida. Justamente por ser conveniente, oportuna e necessária.

Por outro lado, o cigarro eletrônico – considerado como medida alternativa no tratamento do tabagismo, possibilitando considerável diminuição do cigarro convencional – é de venda proibida no país, circunstância que dificulta ainda mais sua aquisição. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) disciplinou a matéria com a seguinte determinação: “Fica proibida a comercialização, a importação e propaganda de quaisquer dispositivos eletrônicos para fumar, conhecidos como cigarros eletrônicos, e-cigarretes, e-ciggy, e-cigar, entre outros especialmente os que aleguem substituição de cigarro, cigarilha, charuto, cachimbo e similares no hábito de fumar ou objetivem alternativa no tratamento do tabagismo”.[5]

Não há, portanto, qualquer liberalidade para o uso do cigarro eletrônico em recintos fechados, públicos ou privados. Os cartazes de proibição continuarão a ser exibidos, observando que o desrespeito confere multa aos responsáveis pelo estabelecimento.

 

Eudes Quintino de Oliveira Júnior, promotor de justiça aposentado, mestre em direito público, pós-doutorado em ciências da saúde, advogado, sócio fundador do escritório de advocacia Eudes Quintino Sociedade de advogados.

[1] https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2023/05/portugal-aposta-em-leis-antifumo-super-restritivas-para-ver-pais-livre-de-tabaco.shtml#:~:text=O%20governo%

[2] https://www.bol.uol.com.br/noticias/2023/05/31/canada-exigira-advertencias-de-saude-em-cada-cigarro.htm

[3] Artigo 196 da Constituição Federal.

[4] Maximiliano, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 125.

 

[5] Resolução da Diretoria Colegiada –  RDC Nº. 46 de 28 de agosto de 2009, em seu artigo 1º.

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