A entrou com ação de indenização por danos materiais sustentando que B deixou de realizar uma prestação de serviços pactuada e adimplida há dois anos, motivo pelo qual pugna pela restituição do valor desembolsado de forma atualizada. B tem uma série de meios de lidar com a ação judicial, e uma delas é o oferecimento de razões de defesa por meio de contestação.
A contestação é a peça processual em que o réu defende-se da pretensão autoral. Para tanto, ele não apenas se opõe aos pedidos feitos pelo autor, mas apresenta a sua versão dos fatos alegados na inicial. Ele produz, portanto, toda a sua matéria de defesa na contestação, juntando, nesta oportunidade, os documentos com que pretende impugnar, falsear e se opor ao pleito autoral.
A contestação é um direito do réu, não um dever. Em que pese B não seja obrigado a oferecer a contestação, o não exercício desse direito no tempo previsto implica a preclusão¹ e revelia, bem como abre-se a possibilidade de que as alegações de fato formuladas pelo autor sejam presumidas verdadeiras (art. 344/CPC). É importante ter em mente que a revelia e seus efeitos não se confundem: a primeira é um estado de fato (o réu não contestou a ação) e a segunda corresponde a efeitos jurídicos (daí, sim, a presunção de veracidade).
A parte autora pode se manifestar solicitando ao juízo que reconheça a revelia e determine a aplicação de seus efeitos, mas o julgador não está adstrito ao pedido da parte. Existem pelo menos quatro razões para que a juízo deixe de aplicar os efeitos da revelia (cf. incisos do art. 345/CPC): em caso de pluralidade de réus, ao menos um contestar a ação; o litígio versar sobre direitos indisponíveis; a petição inicial não estiver acompanhada de instrumento que a lei considere indispensável à prova do ato; e as alegações de fato formuladas pelo autor forem inverossímeis ou estiverem em contradição com prova constante dos autos.
Essa distinção é da maior importância, pois mesmo que o réu seja revel, e somente no caso de não ocorrência dos efeitos da revelia (isto é, caso a julgadora tenha constatado algumas das causas do rol do art. 345 do CPC), ele poderá produzir provas, sendo inclusive intimado dos atos processuais, desde que se faça representar nos autos a tempo de praticá-los (art. 349/CPC). Caso contrário, o processo correrá sem que seja necessário que ele seja intimado de qualquer etapa. No entanto, ainda não estamos falando do mais importante: o oferecimento da contestação. Pois bem.
A contestação é geralmente o primeiro ato do réu no processo de conhecimento². O prazo para a apresentação da contestação tem início no dia seguinte à audiência de conciliação, se designada; a partir da data em que houver a manifestação do réu expressando desinteresse na audiência de conciliação (que só ocorre caso o autor também tenha se manifestado nesse sentido, art. 334, § 4º, I, do CPC); ou conforme as demais hipóteses do art. 231 do CPC. Em todo caso, deve ser oferecida em até quinze dias (art. 335/CPC). O meio mais comum, ficando atrás tão somente da primeira hipótese (art. 335, I, CPC), é o início do prazo no dia (útil) seguinte à juntada do Mandado de Citação com cumprimento positivo nos autos. Lembre-se: a citação ocorre uma só vez, e por isso mesmo não se confunde com a intimação.
Na contestação, o réu deve alegar toda a matéria de defesa, iniciando pela defesa indireta de mérito e mais especificamente pelas chamadas preliminares. As preliminares são explicitadas nos incisos do artigo 337/CPC. Entre as mais comumente suscitadas estão a ausência de interesse de agir, ocorrência de litispendência ou coisa julgada e ilegitimidade passiva. Nesse ponto é importante lembrar que a gratuidade da justiça a ser requerida na contestação não está entre as hipóteses de preliminares; o que está é a impugnação a ser feita pelo réu em caso de indevida concessão do benefício da gratuidade da justiça ao autor.
Após alegar as preliminares, o réu deve se valer de toda a matéria de defesa para impugnar especificamente os fatos e fundamentos contidos na inicial, sob pena de serem presumidos verdadeiros, e explicar por que o pleito autoral deve ser julgado improcedente. Além disso, o Código de Processo Civil dispõe que cabe ao réu comprovar fato extintivo, modificativo ou impeditivo do direito do autor (arts. 336, 341 e 373/CPC). Novamente, enfatiza-se que o momento para juntar as provas é na contestação, com exceção de prova nova, ou que seja passível de conhecimento de ofício e, ainda, caso autorizado por expressa decisão legal (art. 342/CPC).
Voltemos ao nosso caso hipotético. B poderia, quanto à questão de mérito da prestação de serviços e restituição do valor pago, suscitar que o serviço deixou de ser prestado por culpa da parte autora (claro, deverá provar o que alega); ou, que parte da obrigação foi cumprida; e, se for cabível, demonstrar que o serviço foi efetivado e a parte autora busca lucrar às suas expensas com a ação proposta.
Pode ser que o réu tenha efetivamente estabelecido um contrato com o autor, seja verbal ou escrito, se comprometendo a prestar-lhe um serviço. No entanto, ele poderá dizer que o próprio autor, desde o momento da pactuação até o ajuizamento da demanda, obsta a realização do serviço.
Isso considerado, o réu poderá alegar, em matéria preliminar, a ausência de interesse de agir, pois não só em nenhum momento o próprio autor o procurou para requerer o cumprimento da obrigação na via extrajudicial como o próprio colocou embaraços para o cumprimento da obrigação. Além disso, para o sucesso da impugnação, sugere-se que o causídico/estudante ambicione dominar não só o processo civil, mas as causas de excludente de responsabilidade, como a culpa exclusiva da vítima, concorrente ou de terceiro – e sobretudo busque entender bem os elementos que caracterizam a responsabilidade civil.
Desse modo, no mérito propriamente dito, o réu deverá expandir o conhecimento do julgador acerca dos fatos apresentando a sua própria versão, assim como é seu dever apresentar sua oposição, ponto a ponto, aos pedidos que constam na inicial.
Mas digamos que, além de tudo, o réu é conhecedor de que o autor vem se manifestando publicamente a respeito do descumprimento da obrigação de sua parte, ferindo-lhe a honra perante a comunidade.
Diante dessa situação, o réu pode requerer que, para além da impugnação do pleito autoral, o autor seja condenado à indenização pelos danos morais que o causou em razão da mancha em sua reputação perante a comunidade. Com efeito, esse tipo de fato depende de comprovação, mas é aqui que entra nosso próximo tópico: o réu deverá formular um pedido em sede de reconvenção, que será apresentado no mesmo arquivo da contestação, ao fim. Na reconvenção, autor e réu passam a se chamar, respectivamente, autor reconvindo e réu reconvinte.
Caso a julgadora acabe acolhendo a preliminar, feita pelo réu, de ausência de interesse de agir em relação ao pleito autoral, por exemplo, e determine a extinção do feito sem julgamento de mérito (art. 485, VI, do CPC), nada obsta o julgamento da reconvenção (art. 343, § 2º, do CPC), que prosseguirá normalmente. As preliminares da contestação, ademais, podem ser suscitadas na manifestação à reconvenção que o autor-reconvindo apresentará justamente com a réplica à contestação.
Lembre-se que eventual compensação de valores devido à pagamento parcial, por exemplo, não é um novo pedido a ser feito na contestação, mas sim um fato modificativo do direito do autor. Sempre que tiver dúvidas quanto a isso, tente manter em mente que fatos extintivos, modificativos e impeditivos do direito do autor são alegados na contestação e não são contrapedidos, razão pela qual é incorreto situá-los na reconvenção, que, em um caso desses, nem sequer seria conhecida pelo juízo.
Confundiu tudo? Vamos com calma. Abaixo, segue um check-list para que você não esqueça os elementos que devem constar na contestação, e acesse, ao fim, um modelo:
Em caso de apresentação de reconvenção, após requerer a improcedência dos pedidos autorais, formule os seus pedidos, tal e qual se faz na inicial. Nos fatos e fundamentos, lembre-se de já deixar espaço para tanto. O restante fica igual. Veja um modelo de contestação.
¹ A preclusão é a perda de uma faculdade processual – em outras palavras, a perda da possibilidade de realizar um ato processual. A preclusão pode ser lógica (incompatibilidade de um ato com outro praticado anteriormente), consumativa (apresentação de mesmo ato já realizado) ou temporal (perda por transcurso do prazo). Estamos falando da última, o que significa dizer, neste caso, que a parte que não apresenta contestação no momento devido perde a possibilidade de fazê-lo posteriormente, sendo defeso ao réu discutir a matéria que deveria ter sido versada na contestação por tratar-se de questão preclusa.
² Excetua-se da regra geral a interposição de agravo de instrumento visando a reforma de decisão que defere a tutela de urgência ao autor, por exemplo, que pode ser enviada ao Tribunal mesmo antes da propositura da contestação (sobretudo porque o prazo é o mesmo, cf. art. 1.003, § 5º, do CPC).
Detalhes:
Fonte: Universidade Federal do Rio Grande (FURG)
Escrito por Bárbara Ronsoni de Oliveira
Publicado: 12 Outubro 2022
Criado: 12 Outubro 2022
Última Atualização: 15 Junho 2023