CNJ – panorama – na visão de um advogado militante perante o Órgão – dos principais temas e teses em julgamento
*Alexandre Pontieri
O presente artigo apresenta, na visão de um advogado militante perante o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) há mais de treze (13) anos, temas e teses que considera em destaque sendo julgado pelo Órgão de Controle do Poder Judiciário. Esses temas são: magistratura, liberdade de expressão e redes sociais; revisões disciplinares propostas pelas partes e as instauradas de ofício pela Corregedoria Nacional de Justiça e Plenário do CNJ; Processos Administrativos Disciplinares (PAD’s) e suas nuances técnicas e desdobramentos; e magistratura e matérias de natureza jurisdicional – como o Órgão de Controle do Poder Judiciário (CNJ) vem se posicionando sobre o tema em questão.
Magistratura, liberdade de expressão e redes sociais; revisões disciplinares propostas pelas partes e as instauradas de ofício pela Corregedoria Nacional de Justiça e Plenário do CNJ; Processos Administrativos Disciplinares (PAD’s) e suas nuances técnicas e desdobramentos; e magistratura e matérias de natureza jurisdicional – como o Órgão de Controle do Poder Judiciário (CNJ) vem se posicionando sobre o tema em questão.
This article presents, from the perspective of a lawyer who has been active before the National Council of Justice (CNJ) for more than thirteen (13) years, themes and theses that he considers to be highlighted when being judged by the Judiciary Control Body. These themes are: judiciary, freedom of expression and social networks; disciplinary reviews proposed by the parties and those initiated ex officio by the National Justice Inspectorate and the Plenary of the CNJ; Disciplinary Administrative Processes (PAD’s) and their technical nuances and developments; and judiciary and matters of a jurisdictional nature – how the Judiciary Control Body (CNJ) has been positioning itself on the topic in question.
Judiciary, freedom of expression and social networks; disciplinary reviews proposed by the parties and those initiated ex officio by the National Justice Inspectorate and the Plenary of the CNJ; Disciplinary Administrative Processes (PAD’s) and their technical nuances and developments; and judiciary and matters of a jurisdictional nature – how the Judiciary Control Body (CNJ) has been positioning itself on the topic in question.
CNJ – panorama – na visão de um advogado militante perante o Órgão – dos principais temas e teses em julgamento
Temos atuado já por mais de treze anos na advocacia perante o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e, como haveria de ser comum, sempre há temas e teses que mais nos preocupam em nossa atuação.
Listaremos alguns desses temas e teses que nos últimos tempos têm, pelo menos em nossa visão, trazido mais aflições, angústias, e momentos de reflexões técnicas-jurídicas para a defesa dos interesses e direitos de nossos clientes, tentando ainda, nesse pequeno espaço, trazer algumas reflexões críticas sobre cada um dos pontos que abordaremos.
Temas e teses em destaque sendo julgados pelo CNJ – na visão de um advogado militante: magistratura, liberdade de expressão e redes sociais; revisões disciplinares propostas pelas partes e as instauradas de ofício pela Corregedoria Nacional de Justiça e Plenário do CNJ; Processos Administrativos Disciplinares (PAD’s) e suas nuances técnicas e desdobramentos; e magistratura e matérias de natureza jurisdicional – como o Órgão de Controle do Poder Judiciário (CNJ) vem se posicionando sobre o tema em questão.
Pois bem. Vejamos.
Magistratura, liberdade de expressão e redes sociais
Jurisprudência do CNJ sobre liberdade de expressão e redes sociais
Tema que tem sido enfrentando com certa frequência pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) diz respeito à liberdade de expressão e manifestação de magistrados em redes sociais.
E como o Conselho Nacional de Justiça vem tratando essas questões relacionadas à liberdade de expressão e manifestação em redes sociais por parte dos magistrados? (magistrados que também fazem parte dessa nova “sociedade em rede” – termo utilizado pelo sociólogo espanhol Manuel Castells[1]).
Vemos como marcos divisórios nas decisões do CNJ a publicação do Provimento nº 71 de 13.06.2018 (que dispõe sobre o uso do e-mail institucional pelos membros e servidores do Poder Judiciário e sobre a manifestação nas redes sociais[2]), e a publicação da Resolução nº 305 de 17.12.2019 (que estabelece os parâmetros para o uso das redes sociais pelos membros do Poder Judiciário[3] – destacamos que a Resolução 305/CNJ está sendo questionada perante o STF nas ADIs 6293 e 6310 sob a relatoria do Ministro Alexandre de Moraes[4]).
E por que esses marcos divisórios do Provimento CNJ 71/2018 e da Resolução CNJ 305/2019?
Vejamos para poder compreender:
Decisão do Plenário do CNJ dispondo que o Provimento 71/2018 era muito recente:
PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS – INSTAURAÇÃO DE OFÍCIO CONTRA MAGISTRADO – PROVIMENTO 71 DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA.
Pedido de providências arquivado.
(CNJ – PP – Pedido de Providências – Corregedoria – 0009542-42.2018.2.00.0000 – Rel. HUMBERTO MARTINS – 283ª Sessão Ordinária – julgado em 11/12/2018).
Período de transição normativa – vigência do Provimento nº 71/2018 – e anteriores à edição da Resolução nº 305/2019 – “interpretação ponderada da norma”:
“(…)
(CNJ – RD – Reclamação Disciplinar – 0006108-11.2019.2.00.0000 – Rel. LUIS FELIPE SALOMÃO – 360ª Sessão Ordinária – julgado em 22/11/2022).
“(…)
(…)
(CNJ – PAD – Processo Administrativo Disciplinar – 0003379-07.2022.2.00.0000 – Rel. SALISE SANCHOTENE – 64ª Sessão Extraordinária – julgado em 29/11/2022).
Decisões do Plenário do CNJ após a Resolução CNJ 305/2019:
Seguindo o Provimento nº 71/2018 e a Resolução nº 305/2019 (norma posterior ao Provimento 71/2018), o Plenário do CNJ já decidiu que “publicações feitas por magistrados em redes sociais, mesmo que privadas, devem observar o disposto no Provimento n. 71/2018 e na Resolução n. 305/2019”. Nessa linha o atual posicionamento do CNJ:
“(…)
(…)”
(CNJ – PP – Pedido de Providências – Corregedoria – 0000630-17.2022.2.00.0000 – Rel. LUIS FELIPE SALOMÃO – 359ª Sessão Ordinária – julgado em 08/11/2022).
“(…)
“(…)
(CNJ – RD – Reclamação Disciplinar – 0007017-48.2022.2.00.0000 – Rel. LUIS FELIPE SALOMÃO – 3ª Sessão Virtual de 2023 – julgado em 10/03/2023).
“(…)
III – Como muito bem apontado pelo Ministro LUIZ ROBERTO BARROSO, nos autos do MS 35.793, “a nova realidade da era digital faz com que as manifestações de magistrados favoráveis ou contrárias a candidatos e partidos possam ser entendidas como exercício de atividade político-partidária. Tais declarações em redes sociais, com a possibilidade de reprodução indeterminada de seu conteúdo e a formação de algoritmos de preferências, contribuem para se alcançar um resultado eleitoral específico, o que é expressamente vedado pela Constituição”.
IV – As regras previstas no Provimento da Corregedoria Nacional de Justiça n. 71/2019 e na Resolução CNJ n. 305/2019 não tratam de censura prévia ou de proibição de circulação de informações. Cuida-se de regras disciplinares impostas por lei e atos normativos primários, que se destinam a proteger a credibilidade do Poder Judiciário enquanto instituição.
(…)
VI – Importante rememorar que as mídias sociais não constituem um universo à parte, mas sim uma extensão da vida pública e particular do magistrado, que passa a se submeter, por intermédio de suas postagens, ao diuturno escrutínio de familiares, amigos e, principalmente, de desconhecidos […] O juiz, definitivamente, não tem a mesma liberdade de expressão que os demais cidadãos, os quais não estão sujeitos ao regime jurídico da Magistratura, que visa, exatamente, preservar-lhe a independência e a imparcialidade (Ato Normativo n. 0004450-49.2019.2.00.0000, 302ª Sessão Ordinária do Conselho Nacional de Justiça)
(…)
VIII – A Resolução CNJ n. 305/2019 estabelece parâmetros para o uso das redes sociais pelos membros do Poder Judiciário e, por meio do seu art. 10, concede um prazo de 6 (seis) meses contados da sua publicação para que os perfis em redes sociais fossem adequados pelos magistrados. Todavia, isso não se trata de uma abolitio, de uma causa de extinção da punibilidade, até porque um ato administrativo jamais poderia prever causas de extinção da punibilidade, por descumprimento de deveres funcionais previstos em lei.
(…)
(CNJ – PP – Pedido de Providências – Corregedoria – 0005178-90.2019.2.00.0000 – Rel. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA – 104ª Sessão Virtual – julgado em 29/04/2022).
Julgamentos recentes do CNJ sobre o tema (julgados em 05.09.2023)
Trazemos ainda o resultado de dois julgamentos realizados pelo Plenário do CNJ em 05.09.2023 com o entendimento de que “publicações feitas por juízes em redes sociais, mesmo que privadas, devem observar os normativos, pois seus deveres éticos não se esvaem com o fim do expediente forense”, e, que “os magistrados podem ter crenças políticas e interesses em assuntos políticos, mas discrição é necessária para manter a confiança do público no Judiciário”. Veja-se:
Abertura de PADs contra magistrados para apurar manifestações políticas em redes sociais. Inobservância do Provimento CNJ nº 135/2022 e da Resolução CNJ nº 305/2019
A liberdade de expressão não é direito absoluto. No caso dos juízes, deve se ajustar ao necessário para afirmar os princípios da magistratura.
O art. 5º, inciso IV, da Constituição, o art. 19 do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e o art. 13 do Pacto de San José da Costa Rica asseguram a liberdade de expressão aos magistrados. Porém, o próprio enunciado costuma vir acompanhado de marcos restritivos.
A limitação à liberdade de expressão deve ser compatível com o princípio democrático. O ordenamento jurídico pode impor restrições à liberdade de expressão, desde que dentro do indispensável à promoção dos valores de uma sociedade democrática.
No Brasil, os magistrados organizam e arbitram as eleições. Por isso, a Constituição restringe o direito à manifestação política. Veda aos juízes a atividade político-partidária – art. 95, parágrafo único, III.
O art. 35, VIII, da Loman vai além e impõe dever de conduta irrepreensível na vida privada e limita a liberdade de crítica a órgãos do Poder Judiciário.
A Resolução CNJ nº 305/2019, por sua vez, estabelece os parâmetros e as condutas vedadas aos magistrados no uso das redes sociais.
Em 2022, a Corregedoria Nacional de Justiça editou o Provimento nº 135 com diretrizes e vedações sobre condutas e procedimentos dos magistrados e tribunais no período eleitoral e depois dele.
Os normativos do CNJ apenas esclarecem o que já está na Constituição Federal e na Loman.
Portanto, publicações feitas por juízes em redes sociais, mesmo que privadas, devem observar os normativos, pois seus deveres éticos não se esvaem com o fim do expediente forense.
Aos juízes é dada a tarefa de aplicar o direito, a partir de uma posição imparcial.
Os magistrados podem ter crenças políticas e interesses em assuntos políticos, mas discrição é necessário para manter a confiança do público no Judiciário.
Se sua participação pode minar a confiança na sua imparcialidade, cabe ao juiz refrear o envolvimento no debate. Mesmo em redes sociais privadas, deve se abster de opinar em questões de natureza política ou partidária, porque sua palavra, em razão de seu cargo, tem maior alcance na formação de opinião.
Nos casos analisados, os magistrados não observaram a cautela exigida e ultrapassaram os limites da liberdade de expressão. A juíza postou diversas mensagens com conteúdo político no Twitter, enquanto o desembargador teceu comentários ofensivos acerca de características político-partidárias e motes ideológicos da campanha eleitoral no Facebook.
As manifestações se deram no contexto do último pleito eleitoral, em 2022.
Há indícios de afronta ao art. 95, parágrafo único, III, da CF/88 e ao art. 35, VIII, 36, III, da Loman. E ainda aos arts. 1°, 2°, 4º, 7°, 12, II, 13, 15, 16 e 37 do Código de Ética da Magistratura, bem como ao art. 2º, §§ 1º, 2º e 3º e aos arts. 2º, IV, 3º, I, do Provimento nº 135 da Corregedoria Nacional de Justiça, bem como aos arts. 3º, II, “b” e “e”, 4º, II, da Resolução CNJ nº 305/2011.
Para analisar as violações, o Plenário decidiu, por unanimidade, abrir PAD, sem afastar os magistrados, aprovando de plano a portaria de instauração do art. 14, § 5º, da Resolução CNJ nº 135/2011.
No caso da juíza, foi mantido o bloqueio de seu perfil nas redes sociais, determinada anteriormente em sede liminar, com base no art. 19, caput e § 4º, da Lei nº 12.965/2014.
(RD 0007110-11.2022.2.00.0000, Relator: Conselheiro Luis Felipe Salomão, julgado na 13ª Sessão Ordinária em 5 de setembro de 2023; e RD 0007153-45.2022.2.00.0000, Relator: Conselheiro Luis Felipe Salomão, julgado na 13ª Sessão Ordinária em 5 de setembro de 2023).
Fonte: Informativo de JURISPRUDÊNCIA DO CNJ Número 14/2023 Brasília, 15 de setembro de 2023[5].
Apontamentos finais
Esse um breve panorama de alguns julgados do Conselho Nacional de Justiça (criado pela Emenda Constitucional nº 45/2004 e instalado no dia 14.06.2005 – tendo completado 18 anos de existência) a respeito da liberdade de expressão e redes sociais.
É importante destacar que cada processo deve ser analisado individualmente em suas esferas de particularidades e peculiaridades, com a devida observância dos princípios e garantias constitucionais do devido processo legal (CF/88, art. 5º, LIV) e contraditório e ampla defesa (CF/88, art. 5º, LV).
Aqui não se buscou esgotar o tema – que é muito rico em teses e debates – mas trazer um panorama de como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vem se posicionamento a respeito do assunto (liberdade de expressão e redes sociais para magistratura).
Mas o questionamento que fica para reflexão é: até que ponto o nobre Conselho Nacional de Justiça pode ir para determinar o que os magistrados podem ou não postar em suas redes sociais?
A resposta será dada caso a caso em cada processo – desde que assegurados o devido processo legal (CF/88, artigo 5º, LIV), e o contraditório e a ampla defesa (CF/88, artigo 5º, LV).
Revisões disciplinares propostas pelas partes e as instauradas de ofício pela Corregedoria Nacional de Justiça e Plenário do CNJ
Em 16 de setembro de 2022 tivemos a oportunidade de publicar um artigo no portal do CONJUR com o seguinte título: “revisão disciplinar e rito de julgamentos das classes processuais do CNJ”[6].
No referido artigo destacamos à época que “uma das classes processuais mais utilizadas no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é a revisão disciplinar – que tem previsão regimental nos artigos 82 a 88”[7].
Destacamos, assim como fizemos anteriormente, que o artigo 82 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ) dispõe que “poderão ser revistos, de ofício ou mediante provocação de qualquer interessado, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano do pedido de revisão”.
Já em relação a admissão de revisão disciplinar o artigo 83 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ) dispõe que a revisão dos processos disciplinares será admitida: I – quando a decisão for contrária a texto expresso da lei, à evidência dos autos ou a ato normavito do CNJ; II – quando a decisão se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III – quando, após a decisão, surgirem fatos novos ou novas provas ou circunstânccias que determinem ou autorizem modificação da decisão proferida pelo órgão de origem.
O artigo 86 do RICNJ dispõe sobre a possibilidade da instauração de ofício da revisão disciplinar, tendo o seguinte teor o dispositivo regimental: “a instauração de ofício da revisão de processo disciplinar poderá ser determinada pela maioria absoluta do Plenário do CNJ, mediante proposição de qualquer um dos Conselheiros, do Procurador-Geral da República ou do Presidente do Conselho Federal da OAB”.
Como cediço, o CNJ possui competência disciplinar originária e concorrente, podendo instaurar de ofício, avocar ou revisar procedimentos disciplinares, sem prejuízo da atuação das corregedorias locais.
Pois bem. Como já havíamos indicado anteriormente, o artigo 82 do RICNJ dispõe que “poderão ser revistos, de ofício ou mediante provocação de qualquer interessado, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais julgados há menos de um ano do pedido de revisão”.
Ou seja, em relação ao conhecimento da Revisão Disciplinar, a limitação temporal é do prazo decadencial de um (01) ano, sendo essa limitação, salvo melhor juízo, tanto para a parte que pretende propor uma revisão disciplinar perante o Conselho Nacional de Justiça, bem como ao próprio CNJ, quando pretende instaurar tal procedimento de ofício.
Todavia, temos acompanhado julgamentos do Plenário do CNJ e observamos que a questão do prazo decadencial para a instauração de ofício de revisões disciplinares pelo Órgão de Controle do Poder Judiciário (CNJ) sofreu um “alargamento” em relação ao prazo decadencial.
Quando do julgamento do Pedido de Providências (PP) nº 10349-91.2020 na 352ª Sessão Ordinária – julgado em 07.06.2022 – o Plenário do CNJ entendeu que “mesmo tendo decorrido mais de um ano da decisão de arquivamento no Tribunal de origem, o Conselho Nacional de Justiça pode analisar a matéria disciplinar, visto que (a) o prazo decadencial (art. 103-B, § 4º, inciso V, da Constituição Federal) só se aplica se houve instauração de processo administrativo disciplinar na origem e, ainda que assim não se entenda, (b) a decisão que determina a notificação do reclamado para defesa inicia o procedimento de revisão de ofício”[8].
Já no julgamento da Revisão Disciplinar 1932-81.2022 na 4ª Sessão Ordinária de 2023 – julgado em 28.02.2023 – o Plenário do CNJ entendeu que “uma vez preenchidos os requisitos regimentais, não há falar em juízo recursal e/ou em utilização indevida da revisional como sucedâneo recursal”, e ainda, que, “o prazo decadencial estabelecido no art. 103-B, § 4º, inciso V, da Constituição Federal, replicado no art. 82 do RICNJ, é para a instauração da revisão disciplinar e não para a instauração de processo administrativo disciplinar”[9].
Vejamos, como exemplo, o entendimento do CNJ sobre a questão da tempestividade em revisão disciplinar proposta por magistrado: “o acórdão em face do qual são inadmissíveis recursos se torna definitivo no momento de sua publicação, de modo que a insatisfação do Magistrado com o resultado do julgamento e a sucessiva interposição de recursos incabíveis e protelatórios não têm o condão de postergar a data de trânsito em julgado da decisão” (CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0005339-32.2021.2.00.0000 – Rel. GIOVANNI OLSSON – 5ª Sessão Ordinária de 2023 – julgado em 11/04/2023).
Pensamos, com as vênias de praxe, que é necessária uma paridade de armas para a defesa – pois, salvo melhor juízo, a parte não pode ser prejudicada pelo entendimento que “alarga” o prazo decadencial quando a revisão disciplinar é proposta de ofício pelo Órgão Censor.
Outro ponto que temos tentado superar, diz respeito à admissão da revisão disciplinar com a superação dos requisitos do artigo 83 do RICNJ.
Não é incomum como defesa militante perante o CNJ vermos acórdãos seguindo o entendimento de que “o Conselho Nacional de Justiça não é instância recursal ordinária dos julgamentos de natureza disciplinar realizados pelos Tribunais”[10] – o que, para nós que atuamos como advogados perante o CNJ, acaba, em nossa visão, limitando que as partes que optam pelo caminhdo da revisão disciplinar encontre(m) uma via mais estreita (seja pela necessidade de superação do artigo 83 do RICNJ, ou pela obrigatória observância do prazo decadedencial do artigo 86 do RICNJ).
Ao contrário, pelo menos em nossa opinião, é que, quando as revisões disciplinares são instauradas de ofício pelo próprio CNJ, o Órgão de Controle do Poder Judiciário vem formando sua jurisprudência no sentido de que se “admite a instauração de revisão disciplinar, quando da análise das informações prestadas pelo órgão censor local constata-se que a sanção aplicada é inadequada ao contexto fático-probatório ventilado nos autos” (CNJ – PP – Pedido de Providências – Corregedoria – 0006185-83.2020.2.00.0000 – Rel. LUIS FELIPE SALOMÃO – 12ª Sessão Ordinária de 2023 – julgado em 22/08/2023).
Sobre essa questão – revisão disciplinar de ofício pelo CNJ – temos defendido perante o Plenário do CNJ como advogados atuantes que se evite um bis in idem de natureza persecutória sancionadora, pois, em nossa análise, as revisões disciplinares de ofício acabam trazendo todo um desgaste com a abertura processos de natureza disciplinar(es).
Mas essas são apenas algumas poucas reflexões sobre o tema da revisão disciplinar de ofício pelo próprio CNJ – tema que é estudado, trabalhado e discutido sempre a cada novo julgamento – para que o equilíbrio de forças da defesa e do Órgão de Controle do Poder Judiciário (CNJ) encontrem a paridade de armas e o equilíbrio necessários nesse trilhar de natureza técnico processual.
São pontos de nossas preocupações: a paridade de armas entre as partes em litígio ou em contraponto processual, a eternização da condição do(s) investigado(s) ou réu(s), a possibilidade de antecipação implícita e, por vezes, injusta, do cumprimento de sanção / pena que sequer se sabe se será, ao final, aplicada, a razoável duração do processo (CF/88, art. 5º, LXXVIII), devido processo legal (CF/88, art. 5º, LIV), contraditório e ampla defesa (CF/88, art. 5º, LV), observância dos prazos prescricionais e decadenciais para o(s) réu(s) e sua(s) defesa(s) – de modo a se prestigiar a estabilidade garantida constitucionalmente e legalmente pelo princípio da segurança jurídica, etc.
Processos Administrativos Disciplinares (PAD’s) e suas nuances técnicas e desdobramentos
Análise de cases que defendemos em PAD’s perante o Conselho Nacional de Justiça – visão de um advogado militante no CNJ a respeito da dosimetria da pena
Atuando como advogado na defesa de clientes em Processos Administrativos Disciplinares (PAD’s) perante o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já há mais de treze anos, há um tema que me aflige, e vem me afligindo cada vez mais a cada nova defesa que faço: a questão da proporcionalidade / desproporcionalidade na aplicação de sanções de natureza disciplinar aplicadas pelo CNJ.
Como defesa sempre buscamos que nossos clientes tenham para si a aplicação de sanções justas, proporcionais, dignas e equilibradas pelo Plenário do CNJ.
Também sempre pedimos a observância do princípio da dignidade da pessoa humana (CF, artigo 1º, III, da Constituição Federal), principalmente quando defendemos partes que não possuíam qualquer sanção de natureza disciplinar em sua trajetória profissional.
Case 1 – Revisão Disciplinar julgada procedente para desconstituir sanção administrativa aplicada ao juiz no tribunal de origem. Moralidade e interesse público
Revisão Disciplinar julgada procedente para desconstituir sanção administrativa aplicada ao juiz no tribunal de origem. Moralidade e interesse público.
A RevDis foi proposta por magistrado contra acórdão do tribunal de origem que lhe aplicou a pena de censura por suposto descumprimento de decisões da instância superior em agravos de instrumento e em exceção de suspeição.
Para a aplicar a censura, o tribunal local considerou que o magistrado teria ignorado o cumprimento de decisões da 2ª instância nos recursos, todos relacionados a uma Ação Civil de Improbidade Administrativa.
No entanto, verificou-se que a decisão lançada pelo magistrado, restaurando a decisão agravada, foi construída com fundamento em fatos novos a fim de evitar o desfalque financeiro promovido por suposta organização criminosa, cuja atuação é objeto de apuração no STJ.
De início o magistrado requerente proferiu decisão cautelar na Ação Civil, determinando o bloqueio de bens e valores das partes rés. Em sede de agravos interpostos, o tribunal reformou a decisão do juiz
A construção fática e jurídica apresentada foi firmada em circunstâncias diferenciadas e não afastadas no recurso de agravo de instrumento. O magistrado teve o cuidado de pontuar previamente os fundamentos da decisão lançada pela instância superior, para afastar qualquer correlação com os novos fundamentos que, no seu entender, justificaram nova decisão judicial de bloqueio de bens e valores das partes rés.
Ficou demonstrado que um dos julgadores da 2ª instância atuava de forma parcial para retirar o juiz da condução dos processos, o que configuraria sua suspeição, mas isso só foi levado ao conhecimento de todos depois do julgamento e da sanção ao requerente na origem.
Além de atuar de maneira fundamentada, constatou-se que o magistrado usou de prudência e cautela, para impedir possível desfalque criminoso dos cofres públicos.
A decisão do juiz defendeu o interesse público, a moralidade administrativa e o ideal de justiça material que deve nortear a atuação jurisdicional do Estado.
Consignou-se o fato de o juiz não ter atuado em benefício próprio, nem logrou proveito com a decisão questionada. Além disso, não possui condenação por ato infracional praticado no exercício da magistratura e não há notícia de conduta ou ação desabonadora da sua lisura.
Com base nesses argumentos, o Conselho, por maioria, julgou procedente o pedido de Revisão Disciplinar e desconstituiu a sanção administrativa aplicada pelo tribunal de origem. Vencidos os Conselheiros Mauro Pereira Martins (Relator), Jane Granzoto, Luis Felipe Salomão e a Presidente, que julgavam improcedente o pedido; e, parcialmente, os Conselheiros Marcio Luiz Freitas e Mário Goulart Maia, que anulavam a penalidade, mas determinavam o retorno dos autos ao juízo de origem para novo julgamento.
(RevDis 0010252-91.2020.2.00.0000, Relator: Conselheiro Mauro Pereira Martins; Relator para o acórdão: Conselheiro João Paulo Schoucair, julgado na 10ª Sessão Ordinária em 20 de junho de 2023.)[11] – grifamos.
Nossas considerações: na 5ª Sessão Ordinária do CNJ, 11.04.2023, sustentamos oralmente a prerrogativa do cliente em ter a sua revisão disciplinar conhecida e julgada procedente pelo Plenário do CNJ. Após alguns pedidos de vistas regimentais, no dia 20.06.2023 o Plenário do CNJ, por maioria de votos, julgou procedente o pedido de revisão disciplinar para desconstituir a sanção administrativo aplicada pelo Tribunal de origem.
Decisão importante no âmbito do CNJ, pois conseguimos superar os requisitos do artigo 83 do RICNJ[12] e fazer com que o Plenário do CNJ conhecesse da Revisão Disciplinar e, quanto ao mérito, desconstituísse a sanção disciplinar – desproporcional e desarrazoada – aplicada pelo Tribunal de origem.
Case 2 – tese importante firmada pelo CNJ: “em relação à dosimetria da pena conforme julgados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a pena de disponibilidade é grave e não pode ser aplicada pelo simples fato de não ser possível a aplicação de penalidade mais branda e adequada ao caso concreto”
“(…)
(CNJ – PAD – Processo Administrativo Disciplinar – 0000196-33.2019.2.00.0000 – Rel. MARCELLO TERTO – 2ª Sessão Ordinária de 2023 – julgado em 28/02/2023)[13] – grifamos.
Nossas considerações: Algumas das teses que defendemos – principalmente quando do julgamento pelo Plenário do CNJ -, que qualquer sanção que ultrapassasse esses limites da sanção disciplinar de advertência, ou, no máximo, de censura, feriria flagrantemente a proporcionalidade, razoabilidade, e a racionalidade da sanção de natureza disciplinar.
Case 3 – constatado que a Corte de origem “desconsiderou circunstâncias atenuantes, que revelavam a desproporcionalidade da pena de demissão, e verificado que a pena cabível ao caso seria a censura, torna-se premente a modificação da penalidade pelo CNJ”
“(…) 7. Todavia, constatado que a Corte Bandeirante desconsiderou circunstâncias atenuantes, que revelavam a desproporcionalidade da pena de demissão, e verificado que a pena cabível ao caso seria a censura, torna-se premente a modificação da penalidade pelo CNJ.
(CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0009178-02.2020.2.00.0000 – Rel. MAURO PEREIRA MARTINS – 351ª Sessão Ordinária – julgado em 24/05/2022)[14].
Nossas considerações: a ementa do acórdão do CNJ fala por si: desconsideração de circunstâncias atenuantes que revelavam a desproporcionalidade da pena de demissão, tornando premente a modificação da penalidade pelo CNJ.
III – Em nossa visão como advogado, entendemos que nem sempre o CNJ aplica sanções disciplinares dentro dos critérios da proporcionalidade, razoabilidade e racionalidade
Infelizmente, na visão desse advogado, nem sempre o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aplica sanções disciplinares dentro dos critérios da proporcionalidade, razoabilidade e racionalidade.
Respeitamos todas as decisões do Órgão, mas, como advogados, não temos que concordar com todas elas.
Como dito anteriormente, o tema da proporcionalidade / desproporcionalidade na aplicação de sanções de natureza disciplinar aplicadas pelo CNJ é algo que nos aflige como advogados militantes perante o Órgão de Controle do Poder Judiciário.
Poderíamos aqui listar diversos casos em que não concordamos com as sanções disciplinares aplicadas pelo CNJ, mas, vamos nos limitar, como exemplo, a um caso recente que foi julgado pelo Plenário, que reviu a pena de censura aplicada pelo Tribunal de origem para aplicar ao magistrado a pena de remoção compulsória (prevaleceu o voto divergente do Conselheiro Marcello Terto pela aplicação da remoção compulsória – a Conselheira Salise Sanchotene, relatora, votou pela aplicação da sanção de disponibilidade)[15].
Aqui lembramos a visão crítica que temos externado em relação aos filtros do artigo 83 do RICNJ: quando a defesa busca o CNJ através da revisão disciplinar encontra dificuldades para superar seus requisitos; porém, quando o CNJ propõe revisões disciplinares de ofício, temos que os filtros de admissibilidade são mais alargados (mas isso será objeto de um outro artigo específico sobre o tema).
IV – E o que fazer quando entendemos que o Plenário do CNJ “extrapola” na aplicação de sanções disciplinares?
E o que fazer quando entendemos que o Plenário do CNJ “extrapola” na aplicação de sanções disciplinares?
Há vários caminhos técnicos e processuais, mas trazemos aqui, até em razão da limitação de espaço, alguns julgados do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema – a jurisprudência do STF é firme no sentido de permitir ao Poder Judiciário apreciar, no bojo do controle de legalidade, a proporcionalidade e razoabilidade dos atos administrativos. Nessa linha indicamos alguns precedentes:
“(…) 2. A jurisprudência da Corte é no sentido da possibilidade de controle pelo Poder Judiciário de ato administrativo eivado de ilegalidade ou abusividade, podendo ele atuar, inclusive, em questões atinentes à proporcionalidade e à razoabilidade do ato. 3. Agravo regimental não provido. 4. Inaplicável o art. 85, § 11, do CPC, pois o agravado não apresentou contrarrazões. (ARE 947843 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 14/06/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-163 DIVULG 03-08-2016 PUBLIC 04-08-2016).
“(…) O controle judicial de atos administrativos tidos por ilegais ou abusivos não ofende o princípio da separação dos Poderes, inclusive quando a análise é feita à luz dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Precedentes. (…).
(RE 580642 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 09/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-192 DIVULG 01-10-2014 PUBLIC 02-10-2014)
Destacamos ainda, que o próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ) já julgou diversos processos em sede de revisões disciplinares em que reduziu sanções de natureza disciplinar aplicadas injustamente pelas Cortes de origem. Vejamos:
(…)
(…)
(CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0001057-19.2019.2.00.0000 – Rel. CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM – 307ª Sessão – j. 31/03/2020 ).
REVISÃO DISCIPLINAR. MAGISTRADO. APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. NEGLIGÊNCIA NO DESEMPENHO DE FUNÇÕES JUDICANTES. COMARCA SOB RESPONDÊNCIA DO MAGISTRADO. EXCESSO DE TRABALHO CONSTATADO. DEPOIMENTOS FAVORÁVEIS DESCONSIDERADOS NA ANÁLISE DOS FATOS. DESPROPORCIONALIDADE DA REPRIMENDA IMPOSTA. DECISÃO CONTRÁRIA À EVIDÊNCIA DOS AUTOS. REVISÃO DISCIPLINAR JULGADA PROCEDENTE. APLICAÇÃO DA PENA DE CENSURA.
(CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0000933-70.2018.2.00.0000 – Rel. Henrique de Almeida Ávila – 58ª Sessão – j. 13/12/2019).
REVISÃO DISCIPLINAR. MAGISTRADO EM SUBSTITUIÇÃO. EXPEDIÇÃO DE ALVARÁS EM EXECUÇÕES PROVISÓRIAS. PENA DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. DESPROPORCIONALIDADE.
(CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0001841-64.2017.2.00.0000 – Rel. ROGÉRIO NASCIMENTO – 31ª
Sessão – j. 15/02/2018).
REVISÃO DISCIPLINAR – CONCESSÃO DE LIMINARES – AUSÊNCIA DE AFERIÇÃO DAS CONDIÇÕES ELEMENTARES DE PROCEDIBILIDADE – PERSISTÊNCIA MESMO APÓS CIÊNCIA DE CONDUTA DAS PARTES INDICATIVA DE FRAUDE – APLICAÇÃO DE PENA DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA NO TRIBUNAL DE ORIGEM – DESPROPORCIONALIDADE
(…)
(CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0001877-43.2016.2.00.0000 – Rel. LELIO BENTES CORRÊA – 253ª
Sessão – j. 13/06/2017).
E mais ainda do próprio CNJ:
REVISÃO DISCIPLINAR. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DISPONIBIILIDADE COM VENCIMENTOS PROPORCIONAIS. OFENSAS ÀS DISPOSIÇÕES CONTIDAS NO ART. 35, I e VII DA LOMAN C/C ART. PRELIMINARES REJEITADAS. MÉRITO. USO IRREGULAR DO VEÍCULO OFICIAL. SUBSTITUIÇÃO DA PLACA OFICIAL PELA COMUM. DESVIO FUNCIONAL NÃO CARATERIZADO. DESPROPORCIONALIDADE DA SANÇÃO. CONHECIMENTO. PROCEDÊNCIA.
(…)
(CNJ – RD – Reclamação Disciplinar – 0010105-70.2017.2.00.0000 – Rel. ARNALDO HOSSEPIAN – 293ª Sessão – j. 25/06/2019). (grifamos)
Conclusão
O artigo 42 da LOMAN traz como penas disciplinares: advertência (inciso I); censura (II); remoção compulsória (III); disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço (IV); aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço (V); e demissão (VI).
O tema da gradação das penas disciplinares previstas na LOMAN (Lei Orgânica da Magistratura Nacional – Lei Complementar n 35, de 14.03.1979[16]) é de extrema importância e merece total atenção por parte dos advogados que militam perante o CNJ.
Magistratura e matérias de natureza jurisdicional – como o Órgão de Controle do Poder Judiciário (CNJ) vem se posicionando sobre o tema em questão
O artigo 41 da LOMAN (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) é expresso ao dispor que “salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir”.
O Conselho Nacional de Justiça expressamente reconhece que:
“é prerrogativa dos Magistrados, como princípio basilar inerente à carreira, o livre convencimento, pelo qual a partir do caso concreto, e diante das provas apresentadas, tem liberdade para decidir da forma que considerar mais adequada, conforme seu convencimento”
(CNJ – RA – Recurso Administrativo em PP – Pedido de Providências 0004033-72.2014.2.00.0000 – Rel. Conselheiro CARLOS AUGUSTO DE BARROS LEVENHAGEN – 3ª Sessão Virtual – j. 24/11/2015).
Sobre o tema o Supremo Tribunal Federal (STF) já se posicionou:
E M E N T A: QUEIXA-CRIME – DELITOS CONTRA A HONRA SUPOSTAMENTE COMETIDOS POR MAGISTRADOS NO JULGAMENTO DA CAUSA – INOCORRÊNCIA – EXERCÍCIO DA FUNÇÃO JURISDICIONAL – IMUNIDADE FUNCIONAL DOS MAGISTRADOS (CP, ART. 142, III, E LOMAN, ART. 41) – ATIPICIDADE PENAL DA CONDUTA – DISCURSO JUDICIÁRIO COMPATÍVEL COM O OBJETO DO LITÍGIO E QUE GUARDA, COM ESTE, INDISSOCIÁVEL NEXO DE CAUSALIDADE E DE PERTINÊNCIA – AUSÊNCIA, AINDA, DO “ANIMUS INJURIANDI VEL DIFFAMANDI” – INADMISSIBILIDADE DA PRETENDIDA PERSECUÇÃO PENAL – CONSEQÜENTE EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO PENAL. – O Magistrado é inviolável pelas opiniões que expressar ou pelo conteúdo das decisões que proferir, não podendo ser punido nem prejudicado em razão de tais pronunciamentos. É necessário, contudo, que esse discurso judiciário, manifestado no julgamento da causa, seja compatível com o “usus fori” e que, desprovido de intuito ofensivo, guarde, ainda, com o objeto do litígio, indissociável nexo de causalidade e de pertinência. Doutrina. Precedentes. A “ratio” subjacente à norma inscrita no art. 41 da LOMAN decorre da necessidade de proteger os magistrados no desempenho de sua atividade funcional, assegurando-lhes condições para o exercício independente da jurisdição. É que a independência judicial constitui exigência política destinada a conferir, ao magistrado, plena liberdade decisória no julgamento das causas a ele submetidas, em ordem a permitir-lhe o desempenho autônomo do “officium judicis”, sem o temor de sofrer, por efeito de sua prática profissional, abusivas instaurações de procedimentos penais ou civis. A independência judicial – que tem, no art. 41 da LOMAN, um de seus instrumentos de proteção – traduz, no Estado democrático de direito, condição indispensável à preservação das liberdades fundamentais, pois, sem juízes independentes, não há sociedades nem instituições livres” (Inq 2699 QO, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 12/03/2009, DJe-084 DIVULG 07-05-2009 PUBLIC 08-05-2009 EMENT VOL-02359-01 PP-00136 RTJ VOL-00211-01 PP-00211 RT v. 98, n. 886, 2009, p. 469-479) – grifamos.
E ainda o STF:
(…) 3. “Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem, o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir” (art. 41 da Lei Orgânica da Magistratura). (…)” (Inq 2657 AgR, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 26/03/2008, DJe-187 DIVULG 02-10-2008 PUBLIC 03-10-2008 EMENT VOL-02335-01 PP-00030) – grifamos.
Como cediço, a independência judicial é assegurada a todos os magistrados em defesa da ordem jurídica e do direito.
Sobre a independência judicial já tratou o CNJ:
(…) 3. No exercício da função jurisdicional, os magistrados judiciais atuam com autonomia e independência na formação de sua convicção. A independência judicial constitui direito fundamental dos cidadãos, inclusive em sua vertente de direito à tutela judicial e a processo e julgamento por tribunal independente e imparcial. Precedentes do CNJ. Recurso a que se nega provimento
(CNJ – RA – Recurso Administrativo em PETAVU – Petição Avulsa – Secretaria – 0006720-61.2010.2.00.0000 – Rel. WELLINGTON CABRAL SARAIVA – 134ª Sessão Ordinária – j. 13/09/2011).
Da independência judicial e livre convencimento motivado
A independência dos juízes é uma garantia funcional constitucionalmente conferida aos membros do Poder Judiciário.
Nas palavras do professor Luiz Flávio Gomes, “a independência do juiz visa protegê-lo das ingerências e pressões externas (ad extra) em suas atividades jurisdicionais, que devem ser guiadas unicamente pelo ordenamento jurídico”[17].
A independência funcional é uma garantia constitucional da atividade jurisdicional, mantendo o juiz afastado das diversas formas de pressões que possam existir no desempenho de sua função judicante. Essas as lições sempre pontuais do professor Eugênio Raul Zaffaroni[18]:
“Um juiz independente, ou melhor, um juiz simplesmente, não pode ser concebido em uma democracia moderna como um empregado do executivo ou do legislativo, mas nem pode ser um empregado da corte ou do supremo tribunal. Um poder judiciário não é hoje concebível como mais um ramo da administração e, portanto, não se pode conceber sua estrutura na forma hierarquizada de um exército. Um judiciário verticalmente militarizado é tão aberrante e perigoso quanto um exército horintalizado.”
Nas lições de Vinícius de Toledo Piza Peluso e José Wilson Gonçalves:
“A independência dos juízes para decidir e exercer a função jurisdicional com destemor é garantida pela imunidade e liberdade intelectual no respectivo exercício, especialmente quanto à interpretação da lei, não podendo ser punidos em seu desempenho, o que inegavelmente se estende às opiniões que manifestarem e ao conteúdo ou teor das decisões que proferirem, desde que, evidentemente, não incorram em impropriedade ou excesso de linguagem.
Tal cláusula, portanto, tem por finalidade específica tutelar, proteger e preservar a integridade do livre e independente exercício da atividade jurisdicional, resguardando os Magistrados de temores e de pressões, que, se concretizados, poderiam inibir, de modo ilegítimo, a prática regular do ofício de julgar.”
Sobre o tema o Supremo Tribunal Federal (STF) também se posicionou:
QUEIXA-CRIME – DELITOS CONTRA A HONRA SUPOSTAMENTE COMETIDOS POR MAGISTRADOS NO JULGAMENTO DA CAUSA – INOCORRÊNCIA – EXERCÍCIO DA FUNÇÃO JURISDICIONAL – IMUNIDADE FUNCIONAL DOS MAGISTRADOS (CP, ART. 142, III, E LOMAN, ART. 41) – ATIPICIDADE PENAL DA CONDUTA – DISCURSO JUDICIÁRIO COMPATÍVEL COM O OBJETO DO LITÍGIO E QUE GUARDA, COM ESTE, INDISSOCIÁVEL NEXO DE CAUSALIDADE E DE PERTINÊNCIA – AUSÊNCIA, AINDA, DO “ANIMUS INJURIANDI VEL DIFFAMANDI” – INADMISSIBILIDADE DA PRETENDIDA PERSECUÇÃO PENAL – CONSEQÜENTE EXTINÇÃO DO PROCEDIMENTO PENAL. – O Magistrado é inviolável pelas opiniões que expressar ou pelo conteúdo das decisões que proferir, não podendo ser punido nem prejudicado em razão de tais pronunciamentos. É necessário, contudo, que esse discurso judiciário, manifestado no julgamento da causa, seja compatível com o “usus fori” e que, desprovido de intuito ofensivo, guarde, ainda, com o objeto do litígio, indissociável nexo de causalidade e de pertinência. Doutrina. Precedentes. A “ratio” subjacente à norma inscrita no art. 41 da LOMAN decorre da necessidade de proteger os magistrados no desempenho de sua atividade funcional, assegurando-lhes condições para o exercício independente da jurisdição. É que a independência judicial constitui exigência política destinada a conferir, ao magistrado, plena liberdade decisória no julgamento das causas a ele submetidas, em ordem a permitir-lhe o desempenho autônomo do “officium judicis”, sem o temor de sofrer, por efeito de sua prática profissional, abusivas instaurações de procedimentos penais ou civis. A independência judicial – que tem, no art. 41 da LOMAN, um de seus instrumentos de proteção – traduz, no Estado democrático de direito, condição indispensável à preservação das liberdades fundamentais, pois, sem juízes independentes, não há sociedades nem instituições livres” (Inq 2699 QO, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 12/03/2009, DJe-084 DIVULG 07-05-2009 PUBLIC 08-05-2009 EMENT VOL-02359-01 PP-00136 RTJ VOL-00211-01 PP-00211 RT v. 98, n. 886, 2009, p. 469-479) – grifamos.
E ainda o STF:
(…) 3. “Salvo os casos de impropriedade ou excesso de linguagem, o magistrado não pode ser punido ou prejudicado pelas opiniões que manifestar ou pelo teor das decisões que proferir” (art. 41 da Lei Orgânica da Magistratura). (…)” (Inq 2657 AgR, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 26/03/2008, DJe-187 DIVULG 02-10-2008 PUBLIC 03-10-2008 EMENT VOL-02335-01 PP-00030) – grifamos.
Nesse sentido é importante frisar que a jurisprudência do colendo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é firme e pacífica ao dispor que “a insatisfação com o resultado do julgamento ou a pretensão de corrigir supostas falhas na tramitação de procesos devem ser manifestadas pelos meios processuais próprios” (CNJ – RA – Recurso Administrativo em RD – Reclamação Disciplinar – 0009860-88.2019.2.00.0000 – Rel. DIAS TOFFOLI – 305ª Sessão Ordinária – julgado em 03/03/2020).
Nesse sentido, conforme anteriormente mencionado, a jurisprudência do CNJ é firme. Veja-se Excelência:
RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. DISCIPLINAR. SUPOSTA VIOLAÇÃO E ENUNCIADO DE SÚMULA DO TRIBUNAL DE ORIGEM. INCOMPETÊNCIA MATERIAL. QUESTÃO JURISDICIONAL. NÃO PROVIMENTO.
I- A irresignação se refere a exame de matéria eminentemente jurisdicional. Em tais casos, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.
II- Não cabe à Corregedoria regular a atuação jurisdicional de Magistrados, escrutinando o conteúdo das decisões judiciais proferidas, sob pena de violação do art. 41 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional.
(…)
IV– Recurso não provido.
(CNJ – RA – Recurso Administrativo em PP – Pedido de Providências – Corregedoria – 0008004-55.2020.2.00.0000 – Rel. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA – 89ª Sessão Virtual – julgado em 25/06/2021).
CONCLUSÃO
Todos os temas indicados acima são de extrema importância para o trabalho perante o Conselho Nacional de Justiça, destacando que a defesa dos direitos e prerrogativas de quem se defende perante o CNJ é de extrema importância, sempre se buscando que sejam cumpridas as garantias constitucionais do devido processo legal (CF/88, artigo 5º, LIV), do contraditório e ampla defesa (CF/88, artigo 5º, LV), o Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), e, de fundamentalmente, a Resolução CNJ nº 135/2011 (que dispõe sobre a uniformização de normas relativas ao procedimento administrativo disciplinar aplicável aos magistrados, acerca do rito e das penalidades, e dá outras providências).
*Alexandre Pontieri
Advogado com atuação em todas as instâncias do Poder Judiciário; desde 2006 atuando perante os Tribunais Superiores (STF, STJ, TST e TSE), e no Conselho Nacional de Justiça – CNJ (atuação em mais de 490 processos no CNJ) e Conselho Superior do Ministério Público – CNMP; Pós-Graduado em Direito Tributário pelo CPPG – Centro de Pesquisas e Pós-Graduação da UniFMU, em São Paulo; Pós- Graduado em Direito Penal pela ESMP-SP – Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Aluno do Mestrado em Direito da UNB – Universidade de Brasília nos anos de 2018 e 2019 (24 créditos concluídos). alexandrepontieri@gmail.com
Fontes de pesquisa:
Portal do Conselho Nacional de Justiça:
https://www.cnj.jus.br/sobre-o-cnj/jurisprudencia/
Portal do Supremo Tribunal Federal:
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede: do conhecimento à Política. In: Castells, Manuel; Cardoso, Gustavo (org.). A Sociedade em Rede: do Conhecimento à Acção Política. Centro Cultural de Belém, 2005.
MENDES. Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. Gilmar Ferreira Mendes, Paulo Gustavo Gonet Branco. – 8. ed. rev. e atual. – São Paulo: Saraiva, 2013, pág. 270.
[1] CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede: do conhecimento à Política. In: Castells, Manuel; Cardoso, Gustavo (org.). A Sociedade em Rede: do Conhecimento à Acção Política. Centro Cultural de Belém, 2005.
[2] https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/2608
[3] https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3124
[4] “28.11.2022 – Decisão: Após os votos dos Ministros Alexandre de Moraes (Relator), Edson Fachin e Dias Toffoli, que julgavam improcedente os pedidos nas ADIs 6.293 e 6.310, o processo foi destacado pelo Ministro Nunes Marques. A Ministra Rosa Weber (Presidente) antecipou seu voto acompanhando o Relator.” Fonte: portal do STF – www.stf.jus.br
[5] https://atos.cnj.jus.br/files/original215334202309156504d25ea3d37.pdf
[6] https://www.conjur.com.br/2022-set-16/alexandre-pontieri-revisao-disciplinar-cnj
[7] https://www.conjur.com.br/2022-set-16/alexandre-pontieri-revisao-disciplinar-cnj
[8] https://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/Jurisprudencia.seam?jurisprudenciaIdJuris=53540&indiceListaJurisprudencia=2&tipoPesquisa=LUCENE&firstResult=0
[9] https://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/Jurisprudencia.seam;jsessionid=3C2CD73608DCA62A5F78C88D8976165A?jurisprudenciaIdJuris=54226&indiceListaJurisprudencia=5&firstResult=10275&tipoPesquisa=BANCO
[10] (CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0001145-52.2022.2.00.0000 – Rel. VIEIRA DE MELLO FILHO – 117ª Sessão Virtual – julgado em 16/12/2022 ).
[11] Fonte:
Informativo de JURISPRUDÊNCIA do CNJ Número 11/2023 Brasília, 3 de julho de 2023.
Disponível em:
https://atos.cnj.jus.br/files/original2117222023070464a48c623ba16.pdf
[12] O artigo 83 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ) dispõe que a revisão dos processos disciplinares será admitida: I – quando a decisão for contrária a texto expresso da lei, à evidência dos autos ou a ato normavito do CNJ; II – quando a decisão se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III – quando, após a decisão, surgirem fatos novos ou novas provas ou circunstânccias que determinem ou autorizem modificação da decisão proferida pelo órgão de origem.
[13] https://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/Jurisprudencia.seam;jsessionid=64836C5C785C9287BE4D26AA65540EA8?jurisprudenciaIdJuris=54158&indiceListaJurisprudencia=11&firstResult=10225&tipoPesquisa=BANCO
[14] https://www.cnj.jus.br/InfojurisI2/Jurisprudencia.seam?jurisprudenciaIdJuris=53499&indiceListaJurisprudencia=2&tipoPesquisa=LUCENE&firstResult=1
[15] https://www.cnj.jus.br/em-revisao-disciplinar-cnj-aplica-pena-de-remocao-compulsoria-a-magistrado-do-piaui/
[16] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp35.htm
[17] GOMES, Luiz Flávio. A Dimensão da Magistratura no Estado Constitucional e democrático de Direito. São Paulo: Ed. RT, 1997, p. 36.
[18] ZAFFARONI, Eugênio Raul. Poder Judiciário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. P. 88-90.