CNJ e TAC – jurisprudências do Órgão de Controle sobre o tema

Alexandre Pontieri, colunista do JusTocantins

*Alexandre Pontieri

 

Em 06 de março de 2025 publicamos um artigo neste portal Migalhas com o seguinte título: “CNJ e TAC – Termo de Ajustamento de Conduta”[1], no qual apresentamos a seguinte conclusão: “o TAC é um importante mecanismo de soluções de conflitos, pois sabemos o quão é desgastante para magistrados, servidores e serventuários do Poder Judiciário ou delegatários de serventias extrajudiciais ter que responder a processos administrativos disciplinares”.

 

Pois bem. Com a entrada em vigor do Provimento n. 162/2024 como o CNJ passou a decidir a respeito nos TAC’s (Termos de Ajustamento de Conduta)?

 

Vejamos, então, como tem sido a jurisprudência do Conselho Nacional de Justiça sobre TAC’s:

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. QUESTÃO DE ORDEM. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRORROGAÇÃO DE PRAZO. 140 DIAS. DESMEMBRAMENTO DO FEITO. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTO. CONEXÃO FÁTICO-PROBATÓRIA. EXISTÊNCIA. APURAÇÃO CONJUNTA. NECESSIDADE. TAC. MEDIDA AFASTADA PELO PLENÁRIO. QUESTÃO DE ORDEM APROVADA.

  1. Caso em Exame

1.1 Questão de ordem em processo administrativo disciplinar instaurado contra desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.

  1. Questão em discussão

2.1 Necessidade de prorrogação do prazo de conclusão do PAD por mais de 140 dias.

2.2 Análise do pedido de desmembramento do processo administrativo disciplinar e de remessa dos autos para a Corregedoria Nacional de Justiça examinar a viabilidade de propor Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1 Considerando que a fase de oitiva de testemunhas não foi iniciada, constata-se a imprescindibilidade da prorrogação do prazo de conclusão do procedimento.

3.2 As condutas imputadas aos processados ocorreram no curso da sessão de julgamento do mesmo processo e ambiente funcional, evidenciando-se, portanto, inequívoca conexão objetiva e subjetiva entre os processados. Além disso, as testemunhas arroladas pelas defesas são coincidentes, o que reforça a racionalidade da tramitação conjunta para evitar a duplicidade de atos instrutórios e promover a observância dos princípios da eficiência, da celeridade e da economia processual.

3.3 Eventual cisão dos autos, além de ineficiente, poderia resultar em decisões contraditórias sobre condutas praticadas em um único contexto fático, o que, certamente, comprometeria a segurança jurídica e a coerência do juízo disciplinar.

3.4 No ato de instauração do PAD a formalização do TAC foi afastada pelo Plenário deste Conselho. Assim, não há espaço para deferir requerimento desta natureza no curso da instrução processual.

  1. DISPOSITIVO E TESE

4.1 Questão de ordem aprovada. (CNJ – QO – Questão de Ordem em PAD – Processo Administrativo Disciplinar – 0007567-72.2024.2.00.0000 – Rel. DAIANE NOGUEIRA DE LIRA – 6ª Sessão Virtual de 2025 – julgado em 16/05/2025).

 

 

REVISÃO DISCIPLINAR. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 2ª REGIÃO – TRT2. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ORIGEM. AUSÊNCIA DE QUÓRUM DE MAIORIA ABSOLUTA PARA APLICAÇÃO DA PENA DE ADVERTÊNCIA. ART. 93, X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 14, § 5º, DA RESOLUÇÃO CNJ N. 135/2011. DECISÃO CONTRÁRIA À EVIDÊNCIA DOS AUTOS E AOS PARÂMETROS NORMATIVOS VIGENTES. MANIFESTAÇÃO DO ÓRGÃO MINISTERIAL PELA APLICAÇÃO DA PENA DE DISPONIBILIDADE. CONHECIMENTO E PROCEDÊNCIA DA REVISÃO DISCIPLINAR. ENCAMINHAMENTO À CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA PARA AVALIAÇÃO DE REALIZAÇÃO DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC).

  1. CASO EM EXAME

1.1 Trata-se de Revisão Disciplinar (RevDis), de ofício, instaurada por este Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em razão do arquivamento do Processo Administrativo Disciplinar (PAD) n. 1001429-08.2020.5.02.0000, pelo TRT2, decorrente de não ter sido alcançado o quórum de maioria absoluta para aplicação da penalidade de advertência previsto no art. 93, X, da Constituição Federal, art. 14, § 5º, da Resolução CNJ n. 135/2011.

  1. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1 O CNJ busca rever o arquivamento do PAD processado perante o TRT2.

2.2 A RevDis comporta conhecimento sempre que cumprido o prazo constitucional para sua propositura e indicada, em tese, uma das hipóteses previstas no art. 83 do RICNJ.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1 No julgamento de RevDis, deve-se deliberar sob o enfoque das estritas hipóteses de cabimento.

3.2 Pedido revisional fundado no art. 83, inciso I, do RICNJ, deve ter como pressuposto a flagrante dissociação entre o conjunto probatório e o julgamento levado a efeito pelo Tribunal de origem.

3.3 Demonstrada a necessidade de reforma do julgamento que determinou o arquivamento do Processo Administrativo Disciplinar TRT2 n. 1001429-08.2020.5.02.0000, pela exclusiva razão de falta do quórum da maioria absoluta para aplicação da penalidade sugerida pelo relator.

3.4 Considerando o art. 47-A do RICNJ, que possibilita a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) em infrações dessa natureza, é pertinente que a Corregedoria Nacional de Justiça analise a viabilidade dessa medida antes da aplicação da penalidade.

  1. DISPOSITIVO E TESE

4.1 Revisão Disciplinar conhecida e julgada procedente, para desconstituir o acórdão na origem.

Tese de julgamento: (1) O atraso reiterado e excessivo na prolação de sentenças com produtividade insuficiente desde 2012 e o descumprimento de sucessivos planos de trabalho configura infringência ao inciso II do artigo 35 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN); (2) A conduta do magistrado é passível, em tese, da aplicação da pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais pelo prazo de até 90 (noventa) dias; (3) O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) pode ser oferecido previamente à aplicação da penalidade, quando a infração for passível de ajuste e não tenha sido oportunizado anteriormente.(CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0005647-34.2022.2.00.0000 – Rel. MARCELLO TERTO – 4ª Sessão Virtual de 2025 – julgado em 11/04/2025).

 

 

DIREITO ADMINISTRATIVO E DISCIPLINAR. REVISÃO DISCIPLINAR PROPOSTA PELA OAB/SP. CONHECIMENTO PELO RELATOR COMO PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. QUESTÃO DE ORDEM. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO ARQUIVADO NA ORIGEM. REVISÃO POSSÍVEL ATRAVÉS DA REVDIS. REAJUSTE DE POSIÇÃO DO RELATOR. QUESTÃO DE ORDEM ACOLHIDA DE FORMA UNÂNIME. MÉRITO. JUIZ DE DIREITO. INFRAÇÃO FUNCIONAL. VIOLAÇÃO AO DEVER DE URBANIDADE E RESPEITO NO EXERCÍCIO DA MAGISTRATURA. USO DE EXPRESSÕES OFENSIVAS E AMEAÇADORAS CONTRA A PARTE E AS SUAS ADVOGADAS EM AUDIÊNCIA. VIOLAÇÃO DE PRERROGATIVAS DA ADVOCACIA. ACUSAÇÃO INDEVIDA DE “ADVOCACIA PREDATÓRIA”. APLICAÇÃO DO ART. 83 DO RICNJ. EXISTÊNCIA DE JUSTA CAUSA. REVISÃO DISCIPLINAR PROCEDENTE. NECESSIDADE DE OFERECIMENTO DE TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA (TAC) ANTES DA INSTAURAÇÃO DO PAD. REMESSA A CORREGEDORIA NACIONAL.

  1. CASO EM EXAME.
  2. Revisão disciplinar proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São Paulo em face do acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que arquivou reclamação disciplinar, deixando de instaurar processo administrativo disciplinar em desfavor de magistrado;
  3. Conhecimento da RevDis, pelo relator, como PCA. Questão de ordem sobre esse tema submetida a apreciação do plenário;
  4. Quanto ao mérito, magistrado que, na condução de processo judicial, adotou postura incompatível com a urbanidade e respeito exigidos da magistratura, proferindo decisões e manifestações ofensivas, desrespeitosas e ameaçadoras, de majorada gravidade, direcionadas a parte autora e suas advogadas, além de restringir indevidamente a participação presencial das profissionais em audiência;
  5. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
  6. Existem quatro questões em discussão: (i) decidir se contra decisões proferidas pelos Tribunais em procedimentos disciplinares, resolvidas por decisões monocráticas ou colegiadas em caráter definitivo (arquivamento, condenação ou absolvição), estão sujeitas a revisão disciplinar ou procedimento de controle administrativo perante este CNJ; (ii) verificar se o magistrado violou deveres funcionais ao adotar conduta desrespeitosa e ofensiva contra a parte e suas advogadas; (iii) definir se a atuação do magistrado configura infração disciplinar passível de revisão pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ); e (iv) estabelecer se a revisão disciplinar deve resultar na instauração de processo administrativo disciplinar (PAD), antecedido da fase de oferecimento de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC).

III. RAZÕES DE DECIDIR.

  1. Questão de ordem. A revisão disciplinar (RevDis) é sempre cabível para rever atos decisórios proferidos em procedimentos disciplinares com caráter de definitividade (arquivamento, procedência, improcedência), restando ao procedimento de controle administrativo (PCA) as demais hipótese de impugnação;
  2. Mérito. O magistrado, ao longo da condução do processo, reiteradamente utilizou expressões ofensivas, desrespeitosas e ameaçadoras dirigidas à parte e às advogadas, atribuindo-lhes a prática de condutas ilícitas, em afronta aos deveres de imparcialidade e urbanidade previstos na LOMAN e no Código de Ética da Magistratura;
  3. O juiz utilizou expressões como “mentirosa”, “não vem se fazer de santa para mim aqui não”, “vocês ficam procurando idosos, idosinhos, tá? Com essa intenção inescrupulosa”, “fica captando esse pessoal para vir falar mentira aqui em processo”, além de afirmar expressamente que “vocês vão ter que se ver comigo no inquérito”, evidenciando uma postura intimidatória e incompatível com a função jurisdicional;
  4. O juiz fez uso de expressões depreciativas e inadequadas para descrever as demandas levadas a juízo, referindo-se ao caso como “fraude evidente aqui na comarca”, afirmando que “ninguém tem nada de palhaço aqui não” e, ao final, ironizando o depoimento do autor da ação;
  5. A restrição imposta pelo magistrado, impedindo a participação presencial das advogadas na audiência em que se colheu o depoimento pessoal do autor, que compareceu ao ato no fórum da comarca, configurou violação às prerrogativas da advocacia, conforme previsto na Lei nº 8.906/1994.
  6. Os acontecimentos ocorreram nos autos de processo em que o magistrado reclamado sentenciou por três vezes, sendo que as três sentenças foram anuladas ou reformadas pelo TJSP. A primeira sentença foi anulada por não ser hipótese de extinção da ação sem julgamento do mérito; a segunda sentença foi anulada por cerceamento de defesa; a terceira sentença foi reformada para julgar procedente a ação;
  7. O uso desse tipo de linguagem e atitude revelam não apenas falta de isenção e imparcialidade na condução do ato, mas também um profundo desrespeito às partes e aos advogados envolvidos no processo, ferindo frontalmente os deveres de urbanidade, impessoalidade e respeito mútuo que devem nortear a relação entre magistrados e advogados;
  8. O respeito à advocacia e às suas prerrogativas fortalece o Poder Judiciário e assegura a devida prestação jurisdicional, sendo inaceitável a hierarquização entre magistrados e advogados, conforme preceitua o Estatuto da Advocacia;
  9. O acórdão do TJSP que arquivou a reclamação disciplinar contraria texto expresso da lei e a evidência dos autos, sendo necessária sua desconstituição para viabilizar a apuração disciplinar, nos termos do art. 82 e 83 do RICNJ;
  10. Considerando a recente introdução do art. 47-A do RICNJ, que possibilita a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) em infrações dessa natureza, é pertinente que a Corregedoria Nacional de Justiça analise a viabilidade dessa medida antes da instauração do Processo Administrativo Disciplinar;
  11. DISPOSITIVO E TESE.
  12. Questão de ordem acolhida, com reajuste do voto do relator, para conhecer do pedido como revisão disciplinar. Unânime.
  13. Revisão disciplinar conhecida e julgada procedente para desconstituir o acórdão do TJSP que arquivou os autos. Maioria;

Tese de julgamento:

16.1 – A revisão disciplinar (RevDis) é o instrumento cabível para rever atos decisórios proferidos em procedimentos disciplinares com caráter de definitividade (arquivamento, procedência, improcedência), restando ao procedimento de controle administrativo (PCA) as demais hipótese de impugnação;

16.2 – O uso de expressões ofensivas e ameaçadoras por magistrado contra advogados no exercício profissional configura infração disciplinar, violando os deveres éticos e funcionais da magistratura;

16.3 – O Conselho Nacional de Justiça pode revisar decisão de tribunal que arquiva reclamação disciplinar quando houver evidência de justa causa para o PAD;

16.4 – O Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) pode ser oferecido previamente à instauração de Processo Administrativo Disciplinar (PAD), quando a infração for passível de ajuste e não tenha sido oportunizado anteriormente.(CNJ – REVDIS – Processo de Revisão Disciplinar – Conselheiro – 0004690-62.2024.2.00.0000 – Rel. ULISSES RABANEDA – 4ª Sessão Ordinária de 2025 – julgado em 25/03/2025).

 

 

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. JUÍZA ESTADUAL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS. PRELIMINAR PARA CELEBRAÇÃO DE TAC REJEITADA. MÉRITO. REDES SOCIAIS. MANIFESTAÇÕES E COMPARTILHAMENTO DE MENSAGENS DE ÍNDOLE POLÍTICA DIRECIONADAS A AUTORIDADES. CARÁTER OFENSIVO E DEPRECIATIVO.  INOBSERVÂNCIA DO DEVER DE MANTER CONDUTA IRREPREENSÍVEL NA VIDA PRIVADA DE MODO A DIGNIFICAR A FUNÇÃO. VIOLAÇÃO DOS DEVERES IMPOSTOS À MAGISTRATURA. DOSIMETRIA. APLICAÇÃO DA PENA DE DISPONIBILIDADE COM PROVENTOS PROPORCIONAIS PELO PRAZO DE SESSENTA (60) DIAS.

  1. Caso em exame

Processo Administrativo Disciplinar contra magistrada do Tribunal de Justiça do Amazonas, imputando-lhe a prática de conduta incompatível com seus deveres funcionais, decorrente de publicações de caráter político-partidário nas redes sociais durante o período eleitoral de 2022.

  1. Questão em discussão

A questão em discussão consiste em saber se as manifestações de natureza político-partidária veiculadas pela magistrada, durante o período eleitoral, configuram violação aos deveres funcionais da magistratura, ensejando a aplicação de sanção disciplinar.

III. Razões de decidir

A Constituição e a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN) proíbem expressamente a manifestação de magistrados em atividades político-partidárias, em qualquer âmbito, inclusive em redes sociais. As postagens da magistrada continham declarações de apoio a um candidato e críticas ao adversário, comprometendo a imparcialidade e a integridade exigidas pela função.

Restou evidenciado que a magistrada utilizou suas redes sociais para influenciar o eleitorado, violando os princípios de dignidade e imparcialidade inerentes à magistratura, conforme previsto no Código de Ética da Magistratura e na CF/1988, art. 95, III.

  1. Dispositivo e tese

Rejeitada a preliminar de celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). Processo julgado procedente, com a aplicação da penalidade de disponibilidade com proventos proporcionais à magistrada pelo período de 60 dias.

Tese de julgamento: A manifestação político-partidária por magistrado nas redes sociais, ainda que fora de função eleitoral, viola os deveres de imparcialidade e dignidade, sendo passível de sanção disciplinar.(CNJ – PAD – Processo Administrativo Disciplinar – 0006139-89.2023.2.00.0000 – Rel. LUIZ FERNANDO BANDEIRA DE MELLO – 1ª Sessão Virtual de 2025 – julgado em 21/02/2025 ).

 

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. CONSULTA. PROVIMENTO CN N. 162/2024. PROCEDIMENTOS DISCIPLINARES. TERMO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA. ARTIGO 47-A DO RICNJ. APLICAÇÃO RETROATIVA. POSSIBILIDADE.

  1. Caso em exame

1.1 Consulta relacionada ao alcance do Provimento CN n. 162/2024, norma que disciplina o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) previsto pelo artigo 47-A do RICNJ.

  1. Questões em discussão

2.1 Possibilidade de propositura do TAC em procedimentos disciplinares instaurados antes da edição do Provimento CN n. 162/2024.

III. Razões de decidir

3.1 O mecanismo instituído pelo artigo 47-A do RICNJ está em congruência com as medidas que buscam solucionar conflitos por meio de acordos e com a imposição de medidas não punitivas, em especial do Acordo de Não Persecução Penal previsto pelo artigo 28-A do Código de Processo Penal.

3.2. No julgamento do HC n. 185.913/DF, o Supremo Tribunal Federal admitiu a aplicação da norma que institui o ANPP em processos em andamento quando da entrada em vigência da Lei n. 13.964/2019.

3.3. Considerando que o ANPP foi a inspiração para a criação do TAC no âmbito administrativo do Poder Judiciário e que ambos os institutos têm como finalidade a resolução de conflitos com o cumprimento de medidas não punitivas, é natural que possuam regramento comum quando possível, como é o caso da aplicação retroativa aos procedimentos disciplinares ainda não julgados.

3.4 A possibilidade de celebração de TAC em procedimentos disciplinares pendentes de julgamento e instaurados antes da edição do Provimento CN n. 162/2024 preserva a finalidade do mecanismo, qual seja, a solução consensual de uma controvérsia administrativa que resultaria na aplicação de penalidade leve, bem como impede a adoção de soluções diferentes para sujeitos de direito que estão em idêntica situação jurídica.

  1. Dispositivo e Tese de Julgamento

4.1 Consulta respondida.

4.2 Tese de julgamento: “1. É possível a propositura do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) previsto pelo artigo 47-A do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça em procedimentos disciplinares instaurados antes da edição do Provimento CN n. 162/2024 e ainda não julgados. 2. A celebração e a homologação dos Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) em processos não julgados e instaurados antes da edição do Provimento CN n. 162/2024 são de competência exclusiva do Corregedor Nacional de Justiça ou dos Corregedores Gerais e obedecem, no que for aplicável, às regras da norma regulamentadora.”

Dispositivo e precedente relevantes citados: Provimento CN n. 162/2024; STF, HC n. 185.913/DF.

(CNJ – CONS – Consulta – 0003712-85.2024.2.00.0000 – Rel. DAIANE NOGUEIRA DE LIRA – 8ª Sessão Virtual Extraordinária de 2024 – julgado em 19/12/2024).

 

 

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. DESEMBARGADORES. VOTO PROFERIDO EM AUDIÊNCIA. CRIMES SEXUAIS. AÇÃO CIVIL DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS. LINGUAGEM IMPRÓPRIA E DESCRIMINATÓRIA. PRESENÇA DE ELEMENTOS MÍNIMOS INDICATIVOS DE INFRAÇÃO DISCIPLINAR. INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.

  1. CASO EM EXAME

I.I Trata-se de reclamação disciplinar, instaurada de ofício por esta Corregedoria, com o objetivo de aferir a existência de indícios de desvio de conduta de Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO).

I.II. Conforme consta dos autos, no julgamento colegiado de ação de reparação de danos morais movida por vítima de assédio sexual, os Desembargadores reclamados teriam se manifestado de maneira inapropriada, eis que proferiram falas de conteúdo potencialmente preconceituoso em relação à vitima, emitindo juízo de valor que teria extrapolado os limites da análise jurisdicional.

  1. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

II.I. Ausência dos requisitos necessários à celebração de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC.

II.II. Existência de elementos indiciários do desvio de conduta dos Desembargadores requeridos a justificar a instauração de processo administrativo disciplinar.

III. RAZÕES DE DECIDIR

III.I Considerando o disposto no art. 47-A, § 5º, do RICNJ, importa notar que a gravidade da conduta imputada aos requeridos supera o limite para que seja oportunizada a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta – TAC.

III.II À luz do quadro fático-processual pormenorizado nos autos, verifica-se a existência de indícios do cometimento de infração ético-disciplinar pelos magistrados que, no exercício da parcela do poder estatal que lhe é atribuída, agiram de forma aparentemente abusiva na exposição de suas fundamentações em voto proferido oralmente em processo judicial, violando, em tese, os deveres: (i) de cumprir e fazer cumprir (com independência, serenidade e exatidão) as disposições legais e os atos de ofício; (ii)  tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça, e atender aos que o procurarem, a qualquer momento, quanto se trate de providência que reclame e possibilite solução de urgência. (iii) de garantir e fomentar a dignidade da pessoa humana; (iv) de se pautar, no desempenho de suas atividades, sem receber indevidas influências externas e estranhas à justa convicção que deve formar para a solução dos casos que lhe sejam submetidos; (v) de evitar todo o tipo de comportamento que possa refletir preconceito; (vi) de atuar de forma cautelosa/prudente, atento às consequências que as suas decisões podem provocar; e (vii) de proceder de forma compatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções.

  1. DISPOSITIVO

IV.I Ante o exposto, nos termos do artigo 13 da Resolução CNJ n. 135, e do artigo 8º, III, e 69 do RICNJ, proponho a instauração de PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR em desfavor dos requeridos, Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), a ser distribuído a um Conselheiro Relator, por possível infringência dos seguintes dispositivos: artigos 35, inciso I, IV da LOMAN e artigos 3º, 5º, 8º, 9º, 22, 24, 25, 37 e 39 do Código de Ética da Magistratura. O enquadramento legal apontado a partir da delimitação fática da acusação é apenas preliminar, ficando postergado ao momento do julgamento do PAD eventual capitulação definitiva.

(CNJ – RD – Reclamação Disciplinar – 0001686-17.2024.2.00.0000 – Rel. MAURO CAMPBELL MARQUES – 14ª Sessão Ordinária de 2024 – julgado em 05/11/2024).

 

 

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. JUÍZA ESTADUAL. PRORROGAÇÃO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. PRELIMINAR PARA CELEBRAÇÃO DE TAC REJEITADA. MÉRITO. MANIFESTAÇÕES DE CUNHO POLÍTICO-PARTIDÁRIO, CARÁTER HOMOFÓBICO E PRECONCEITUOSO NAS REDES SOCIAIS. FATOS RECONHECIDOS. VIOLAÇÃO DOS DEVERES IMPOSTOS À MAGISTRATURA. DOSIMETRIA. APLICAÇÃO DA PENA DE DISPONIBILIDADE COM PROVENTOS PROPORCIONAIS.

  1. Os fatos imputados decorrem de publicações de conteúdo político-partidário, de teor discriminatório e preconceituoso nas redes sociais em período eleitoral, mesmo ciente das proibições impostas aos membros da magistratura.
  2. Nos termos do art. 47-A do Regimento Interno do CNJ, a celebração de Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) constitui medida prévia de não persecução disciplinar e que antecede a própria autuação do respectivo PAD. Inexiste previsão normativa no âmbito deste Conselho que estabeleça a possibilidade de celebração de TAC após a instauração do processo disciplinar, como no presente caso.
  3. A livre manifestação do pensamento está intimamente ligada ao dever de responsabilidade. Apesar da ampla titularidade do direito à liberdade de expressão, autoridades que trabalham na administração da Justiça, como os juízes por exemplo, podem estar sujeitas a distintas restrições em razão da posição de relevo do cargo que ocupa e das suas responsabilidades perante a sociedade. De acordo com o disposto na Resolução CNJ nº 305/2019 (art. 4º), constitui conduta vedada ao magistrado emitir opinião nas redes sociais que demonstre atuação em atividade político-partidária, apoio ou crítica a candidato, lideranças políticas ou partidos políticos. É defeso, ainda, emitir ou compartilhar opiniões que caracterize discurso discriminatório ou de ódio, especialmente os que revelem racismo, LGBT-fobia, misoginia, antissemitismo, intolerância religiosa ou ideológica, entre outras.
  4. Além do reconhecido contexto político-partidário, as postagens (e respectivas mensagens) realizadas direcionam fortes ataques contra nordestinos e homossexuais, com o evidente viés preconceituoso e discriminatório, desconsiderando o dever de prudência e cautela que se espera dos magistrados.
  5. Descumprimento do dever de o magistrado comportar-se na vida privada de modo a dignificar a função, cônscio de que o exercício da atividade jurisdicional impõe restrições e exigências pessoais distintas das acometidas aos cidadãos em geral.
  6. Firme nos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a pena a ser aplicada deve ser de disponibilidade, pelo período de 60 (sessenta) dias, consoante o art. 6º da Resolução/CNJ nº 135/2011.
  7. Imputações julgadas procedentes, com imposição da pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço.

(CNJ – PAD – Processo Administrativo Disciplinar – 0002094-42.2023.2.00.0000 – Rel. JOÃO PAULO SCHOUCAIR – 3ª Sessão Extraordinária de 2024 – julgado em 20/08/2024).

 

 

Conclusão

 

O TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) é um importante mecanismo de soluções de conflitos no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Por isso, além do acompanhamento das Normas do CNJ, também é de extrema importância o acompanhamento das jurisprudências que vão se formando após os longos debates em processos que são levados a julgamento pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça.

 

 

*Alexandre Pontieri

Advogado desde 2001 (inscrito na OAB-SP e na OAB-DF) com atuação em todas as instâncias do Poder Judiciário; desde 2006 atuando perante os Tribunais Superiores (STF, STJ, TST e TSE), e no Conselho Nacional de Justiça – CNJ (atuação em mais de 520 processos no CNJ) e Conselho Superior do Ministério Público – CNMP; Pós-Graduado em Direito Tributário pelo CPPG – Centro de Pesquisas e Pós-Graduação da UniFMU, em São Paulo; Pós- Graduado em Direito Penal pela ESMP-SP – Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo. Aluno do Mestrado em Direito da UNB – Universidade de Brasília nos anos de 2018 e 2019 (24 créditos concluídos); Membro de Comissões da OAB-SP e da OAB-DF. alexandrepontieri@gmail.com

[1] https://www.migalhas.com.br/depeso/425636/cnj-e-tac–termo-de-ajustamento-de-conduta

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Redação do Site JusTocantins.
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